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Cartéis em licitações públicas e a Lei nº 14.133/2021: Como prevenir o envolvimento da empresa em práticas anticoncorrenciais com o advento da nova Lei de Licitações

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A nova Lei de Licitações, nº 14.133/2021 entrou em vigor para, no prazo de 2 (dois) anos, substituir a Lei das Licitações (Lei nº 8.666/1993), a Lei do Pregão (Lei nº 10.520/2002) e revogar o Regime Diferenciado de Contratações – RDC (Lei nº 12.462/11).

Como tivemos a chance de demonstrar em outros posts aqui, no Blog, a nova Lei de Licitações visa a otimizar os processos licitatórios do país, equacionando agilidade para a compra ou contratação de bens e serviços à razão de transparência, accountability e integridade.

Outrossim, ao destacar a prerrogativa da Administração Pública pelo melhor preço e condições que lhe sejam mais vantajosas (permitindo, para tanto, a inversão das fases a que ordinariamente estamos habituados), tende a diminuir os custos operacionais dos processos licitatórios,porquanto estes deverão ocorrer, via de regra, por meio eletrônico.

Nada obstante os benefícios acima elencados, há flancos na estrutura da nova Lei de Licitações que facilitam práticas non-compliant bastante gravosas, como, por exemplo, a emergência fabricada, e, em voga no artigo de hoje, a cartelização.

Os cartéis em licitações públicas são uma espécie de cartel e caracterizam-se, igualmente, como infrações da ordem econômica puníveis com severas penalidades pela “Lei de Defesa da Concorrência” (Lei nº 12.529/2011) e por outros diversos diplomas legais, como veremos adiante.

Antes de qualquer coisa, vale um adendo: Para fins didáticos, conceituaremos licitação pública como o procedimento administrativo previsto em lei e que é utilizado pela Administração Pública para selecionar a proposta mais vantajosa (melhor custo-benefício) para contratação de obras e serviços, compra de produtos, alienações e locações.

Alguns aspectos fazem do processo licitatório um ambiente propício à atuação dos cartéis, e isso já durante a vigência das lei anteriores.

O primeiro destes aspectos refere-se à publicidade de todo o procedimento licitatório. Insta salientar, neste momento, que a publicidade é um dos vários princípios norteadores da licitação, e tem como função garantir a qualquer interessado as faculdades de participação e de fiscalização dos atos desses procedimentos administrativos.

Entretanto, no momento em que um edital de licitação torna-se público, as condições de concorrência já poderão ser preliminarmente estipuladas e estabelecidas entre os licitantes.

Para melhor ilustração e compreensão, veja-se o disposto no artigo 12, inciso VII sobre o plano de contratação anual.

Em que pese o, seja taxativo ao pontuar que o plano de contratação anual tem por objetivo racionalizar as contratações dos órgãos e das entidades públicas, garantindo, assim, o alinhamento com o planejamento estratégico e subsidiando a elaboração de leis orçamentárias, a partir do momento em que os licitantes tiverem ciência, pela necessária publicidade dos processos licitatórios, de uma estimativa das licitações a serem processadas, poderão, com razoável facilidade e antecedência, organizar suas atuações de forma combinada e, desta forma, assegurar a divisão dos ganhos desta empreitada.

Ainda em razão do princípio da publicidade, a identidade dos concorrentes deverá ser, do mesmo modo, pública, o que garante conhecer quem são as empresas que participarão das disputas, favorecendo tentativas de conluios entre elas.

Outro ponto que merece destaque refere-se à possibilidade de haver um número reduzido de empresas qualificadas a prestar ou fornecer o serviço/produto licitado. Desta forma, poderão ocorrer não só constantes contatos e comunicações entre as empresas, facilitando, deste modo, os acordos ilícitos, mas também um grande conhecimento que cada licitante possui em relação à maneira de atuação dos demais.

Penalidades pela prática de infrações anticoncorrenciais

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A “Lei de Defesa da Concorrência” – LDC trata em seu Capítulo III, das penalidades pela prática de infrações contra a ordem econômica. Deste modo, pode-se observar que as sanções a que as empresas, seus administradores e demais pessoas físicas estão sujeitas são bastante graves.

Desta forma, verifica-se abaixo algumas destas sanções:

  1. Empresa: multa de 0,1% a 20% do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado obtido, no último exercício anterior à instauração do processo administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração;
  2. Administrador: multa de 1% a 20% daquela aplicada à empresa, sempre que este for direta ou indiretamente responsável pela infração cometida;
  3. Demais Pessoas Físicas ou Jurídicas de Direito Público ou Privado, bem como quaisquer associações de entidades ou pessoas constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, com ou sem personalidade jurídica, que não exerçam atividade empresarial, não sendo possível utilizar-se o critério do faturamento bruto: Multa de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) a R$ 2.000.000.000,00 (dois bilhões de reais). Estão incluídos aqui os funcionários, consultores, contadores, entre outros sujeitos envolvidos.

Nos casos de reincidência de infrações, as multas cominadas serão aplicadas em dobro e quando houver continuidade de atos ou situações que configurem infração da ordem econômica, haverá multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), podendo ser aumentada em até 50 (cinquenta) vezes, se assim recomendar a situação econômica do infrator e a gravidade da infração, sempre que houver prévia decisão do Tribunal determinando sua cessação.

De forma cumulativa ou isoladamente, poderão ainda ser impostas, dentre outras, as seguintes penalidades aos infratores:

  1. Publicação, em meia página e a expensas do infrator, em jornal indicado na decisão, de extrato da decisão condenatória por prazo determinado em lei;
  2. Proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e participar de licitação da administração pública federal, estadual, municipal e do Distrito Federal, por prazo não inferior a 5 (cinco) anos;
  3. Inscrição no Cadastro Nacional de Defesa do Consumidor;
  4. Recomendação aos Órgãos Públicos competentes para que não seja concedido ao infrator o parcelamento de tributos federais ou para que sejam cancelados, no todo ou em parte, incentivos fiscais ou subsídios públicos;
  5. Proibição de exercer o comércio em nome próprio ou como representante de pessoa jurídica, pelo prazo de até 5 (cinco) anos.

Ademais, as empresas poderão ser processadas na esfera cível e as pessoas físicas na esfera criminal, quando envolvidas em condutas anticoncorrenciais, sujeitando-se, estes últimos, à penalidade de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa, com base no art. 4º, da Lei nº 8.137/1990, que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo.

Além dessas, quando as práticas anticoncorrenciais forem praticadas no âmbito das licitações públicas, os envolvidos estarão sujeitos ainda às penalidades do art. 155, incisos IX a XII c/c artigo 156, § 5º, da nova Lei de Licitações – Lei nº 14.133/2021, podendo a empresa responsável podendo ser impedida de licitar ou contratar no âmbito da Administração Pública direta e indireta de todos os entes federativos, pelo prazo mínimo de 3 (três) anos e máximo de 6 (seis) anos, sem prejuízo de ser enquadrada, também, no artigo 5º, inciso IV, da “Lei Anticorrupção Empresarial” – Lei nº 12.846/2013.

Casos envolvendo cartéis em licitações públicas

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Nos últimos anos, diversos casos de cartel em licitações públicas envolvendo construtoras brasileiras vieram à tona por meio de investigações realizadas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade.

Um desses casos é bastante famoso e foi revelado ao Órgão de Defesa Econômica pela construtora Camargo Corrêa e envolve nomes de outras grandes construtoras do Brasil, como: Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS e Queiroz Galvão. Nesta ocasião a Camargo Corrêa relatou a existência de um megaesquema de cartel em obras de metrôs de 07 (sete) estados e do Distrito Federal, que durou dos anos 1998 a 2014 e afetou ao menos 21 licitações públicas brasileiras.

Outro caso recentemente divulgado, mas objeto de apurações há alguns anos, é o que resultou na condenação de 5 (cinco) empresas (dentre elas, a empresa catarinense Tigre S/A.) e 6 (seis) pessoas físicas por formação de cartel em licitações públicas para fornecimento de tubos e conexões de PVC para obras de infraestrutura de saneamento (água e esgoto), obras prediais e de construção civil. Ao todo, as multas aplicadas aos envolvidos no conluio ultrapassam R$ 192,2 milhões.

Por fim, tenha-se a instauração, pelo CADE, de processo administrativo contra as operadoras Claro, Oi Móvel e Telefônica Brasil para investigar suposta prática de cartel em licitações públicas para prestação de serviços de comunicação de dados a órgãos da Administração Federal. 

Como prevenir o envolvimento da empresa em práticas anticoncorrenciais frente à nova Lei de Licitações

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Em dezembro de 2019, o CADE publicou o seu Guia de Combate a Cartéis em Licitação, com orientações práticas sobre como identificar os carteis (elementos facilitadores, formas de conluio e seus indícios) e preveni-los.

Entretanto, anterior a esse guia é o Guia de Compliance do CADE, lançado em 2016, e que fornece diversas orientações sobre a estruturação e os benefícios advindos da adoção de Programas de Compliance Concorrencial pelas empresas.

Assim, de acordo com o Guia, diversas práticas podem ser adotadas pelas empresas a fim de se evitar a caracterização ou o envolvimento destas em infrações anticoncorrenciais.

Abaixo, algumas das recomendações realizadas pelo Guia de Compliance do Cade, às empresas e seus colaboradores:

  1. Nunca compartilhar com concorrentes informações próprias confidenciais, concorrencialmente sensíveis ou relacionadas às estratégias da empresa;
  2. Não discutir, negociar, fazer acordo com concorrentes sobre preços ou divisão de mercados e/ou estabelecimento de limites de atuação no que se refere a territórios, produtos e/ou clientes;
  3. Caso a conversa telefônica da qual participe com concorrentes caminhe para temas relacionados a informações concorrencialmente sensíveis, recusar-se a tratar do tema e, caso o interlocutor insista no assunto, desligar o telefone. Proceder da mesma forma ainda que esteja presente na conversa (conferência telefônica – conference call) apenas como ouvinte, avisando a todos do desligamento. Solicitar para sempre deixar registrado em ata o motivo da saída;
  4. Caso a reunião da qual participe com concorrentes caminhe para temas relacionados a informações concorrencialmente sensíveis, recusar-se a tratar do tema e, caso o interlocutor insista no assunto, sair do recinto e fazer constar a recusa e o registro de saída na Ata de Reunião (se houver). Proceder da mesma forma ainda que esteja presente na conversa apenas como ouvinte;
  5. Faça-se acompanhar de advogado da empresa em reuniões com concorrentes que se façam estritamente necessárias. O advogado servirá não apenas para esclarecimentos de dúvidas quanto a temas possíveis de serem abordados, como também para fiscalizar e atestar a regularidade dos temas tratados;
  6. Reportar imediatamente ao Departamento Jurídico qualquer conversa imprópria de iniciativa de um concorrente ou a divulgação por ele, por qualquer meio, de informações concorrencialmente sensíveis, para conhecimento e eventuais providências pelo Jurídico da organização.

Cabe destacar que os treinamentos periódicos e específicos dos colaboradores que atuem nos processos licitatórios da companhia mostram-se importante ferramenta de combate aos cartéis em licitações públicas.

Deste modo, todo e qualquer funcionário que seja responsável pelo preenchimento das propostas de preços a serem submetidas à Administração Pública, bem como aqueles que participem de reuniões de tomadas de propostas precisam de treinamentos especiais sobre todas as normas de licitação e contratos do ordenamento jurídico pátrio, bem como sobre a “Lei de Defesa da Concorrência” e de todas as demais legislações correlatas ao tema.

Além do mais, todos os procedimentos que envolvam processos licitatórios deverão ser monitorados de forma criteriosa e contínua pela empresa, a fim de que sejam levantados e apurados todos os dados e informações sobre a condução desses processos.

Um outro grande aliado na prevenção e na mitigação dos riscos de envolvimento em práticas anticoncorrenciais é o Programa de Compliance, que, inclusive, passa a ser requisito de comprovação obrigatória aos licitantes de contratações de grande vulto, a teor do artigo 25, §4º, da nova Lei de Licitações passa a ser obrigatório (Saiba mais aqui).

Significa dizer que, agora, elaborar, comunicar, publicar e reter políticas de Compliance voltadas à prevenção e de redução dos riscos de ocorrência de infrações à “Lei de Defesa da Concorrência” é fundamental não apenas para mitigar riscos de penalização com base na  Lei nº 12.529/2011, mas, sobretudo, nas da lei especial – nova Lei de Licitações – Lei nº 14.133/2021.

Acordos de Leniência licitações públicas e a Lei nº 14.133/2021

Um Programa de Compliance robusto e bem estruturado é capaz de detectar rapidamente o envolvimento em possíveis esquemas fraudulentos, que por algum motivo, não tiveram sido previamente identificados. Com a rápida identificação das infrações, as entidades poderão ajustar com a Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica a celebração de Acordos de Leniência ou de Termos de Compromisso de Cessação, a depender do caso, evitando ou reduzindo, desta forma, as diversas penalidades, sanções e multas a que estão sujeitas.

Os Acordos de Leniência e os Termos de Compromisso de Cessação realizados pelo Cade se mostram como uma importante ferramenta de atenuação de penalidades de pessoas físicas e jurídicas envolvidas em cartéis e/ou em outras práticas anticoncorrenciais, que em contrapartida precisam preencher e cumprir todos os requisitos e exigências da lei.

Conclui-se, então, que algumas particularidades dos procedimentos licitatórios podem contribuir para a prática de cartéis em licitações públicas. De todo modo, o empresário dispõe de instrumentos e mecanismos bastante eficazes na prevenção e na mitigação dos riscos do cometimento dessas infrações anticoncorrenciais por suas empresas e funcionários, contribuindo, deste modo, para a perenidade dos seus negócios.

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Gostou do tema abordado neste post e quer saber mais detalhes sobre Acordos de Leniência e os Termos de Compromisso de Cessação realizados pelo Cade? Então, deixe um comentário e assine nossa newsletter para se manter atualizado.

Abraços e até a próxima!

*Artigo redigido por Thiago Henrique Nielsen e atualizado por Roberta Volpato

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